Novo presidente da antiga Apeop diz que não há “bala de prata” para recuperar a imagem das construtoras investigadas na Lava Jato
Mauro Arbex*
O novo presidente da Associação para Progresso da Infraestrutura (antiga Apeop), Carlos Eduardo Lima Jorge, que tomou posse no início de março, considera essencial que a entidade seja transparente para garantir a participação e frequência das construtoras associadas. Por essa razão, um novo código de ética associativo é uma das primeiras providências de Carlos Eduardo à frente da entidade.
“O país passa por uma profunda transformação de valores éticos e a entidade de classe tem de refletir essas mudanças”, afirma, em entrevista exclusiva ao Relatório Executivo desta semana. “O código é um manual de conduta da entidade e de seus dirigentes enquanto representantes da associação. O princípio básico é a transparência e a isonomia no tratamento das empresas.”
Para Carlos Eduardo, “não existe uma bala de prata” para resolver o problema de imagem das grandes empreiteiras, que ficou arranha com as denúncias da operação Lava Jato. “O primeiro grande passo por parte dessas empresas será o compromisso de mudança de postura, não aprovando um programa de compliance como retórica, mas efetivamente uma mudança naquilo que foi condenado e está sendo julgado como ilícito”, diz.
A seguir, a entrevista que concedeu ao Relatório Executivo.
Relatório Executivo – A Apeop, sob a sua gestão, mudou de nome. Agora é Associação para o Progresso da Infraestrutura? Por que houve essa mudança?
Carlos Eduardo Lima Jorge – Seguindo as tendências e reflexos do próprio mercado que atuamos, não tinha mais sentido manter o nome pela modalidade do tipo de contratação de obra, ou seja, a obra pública. Hoje, a infraestrutura se desenvolve em diferentes modalidades, como concessões, parcerias, locação de ativos. O empreendimento da infraestrutura se tornou um empreendimento de fato. Por essa razão, resolvemos mostrar a abrangência geral da infraestrutura porque é disso que se trata. As empresas associadas atuam tanto nas obras ordinárias, como construção de escolas, hospitais, postos de saúde, quanto aeroportos, rodovias, ferrovias e concessões nas mais diferentes modalidades. Ao mudar a abrangência, passamos a refletir o escopo dos negócios no nosso mercado. Além disso, a associação deixou de ter um limite estadual e passa a admitir empresas não sediadas no Estado de São Paulo. As empresas dependem, cada vez mais, de um regramento que vem da área federal.
RE – Quantos associados a entidade tem hoje?
Carlos Eduardo – Hoje, são 95 empresas. Nossa expectativa é chegar a ter até 150 empresas, um número bem representativo. Passamos a admitir, em nossos estatutos, que as empresas associadas não têm necessariamente de atuar como construtora. Outras categorias poderão se associar, como consultorias, agentes financeiros, projetistas. Hoje, os players que envolvem os negócios da infraestrutura vão muito além das construtoras.
RE – Um dos primeiros atos de sua gestão é a aprovação do Código de Ética Associativo. Por que foi criado esse código?
Carlos Eduardo – Eu considero fundamental nos dias de hoje conferir segurança e transparência para garantir a participação e frequência das construtoras associadas. O país passa por uma profunda transformação de valores éticos e a entidade de classe tem de refletir essas mudanças. Já houve casos de empresas que estavam desenvolvendo programas de compliance e foram aconselhadas a não frequentar associações, sindicatos. O que queremos conferir é um grau de transparência e segurança absolutas para que essas empresas possam frequentar com tranquilidade a associação.
RE – Quais os principais pontos desse novo código de ética?
Carlos Eduardo – O código de ética associativo é simples, não traz muita novidade e não procura regular as atividades das empresas associadas. As empresas devem responder por seus atos. Já existem vários órgãos que fiscalizam esses atos. O código é um manual de conduta da entidade e de seus dirigentes enquanto representantes da associação. O princípio básico é a transparência e a isonomia no tratamento das empresas. No caso da transparência, me refiro à forma como a associação se relaciona com os poderes públicos, divulgando em seu site a agenda dessas reuniões, quem participou, qual foi a pauta. Da mesma forma, deixar claro e transparente no seu portal as reuniões internas da entidade, os assuntos tratados e as decisões tomadas. Mostrar quais são as defesas que a associação tem em relação ao setor. Por exemplo, sempre a adoção de preços justos, subdivisão de empreendimentos, em parcela tecnicamente e economicamente viáveis, pontualidade de pagamento, tratamento isonômico entre as interessadas. Deixar claro também que, enquanto entidade, não haverá apoio implícito ou explícito para candidaturas ou cargos políticos. Isso não impede que a associação formule propostas ou defenda ideias de candidatos. Mas não apoio explícito.
RE – Muitas das empresas associados à entidade estiveram envolvidas nas investigações da Lava Jato por supostas irregularidades em obras públicas. Como mudar a imagem das empresas, que ficou arranhada junto à opinião pública?
Carlos Eduardo – É um processo que depende de muitas variáveis. Não exista uma “bala de prata” que resolva isso. O primeiro grande passo por parte dessas empresas será o compromisso de mudança de postura, não aprovando um programa de compliance como retórica, mas efetivamente uma mudança naquilo que foi condenado e está sendo julgado como ilícito. Não tenho dúvida de que isso que aconteceu no Brasil nos últimos anos, em função dessas operações, alertou para uma série de procedimentos. Há várias coisas em discussão atualmente. É preciso que as empresas reflitam sobre isso. O programa de compliance é uma das primeiras exigências quando as nossas empresas buscam parceiros para financiamento em projetos.
RE – Que outras medidas o sr. pretende adotar em sua gestão como presidente da associação?
Carlos Eduardo – Tem várias. No momento, estamos tratando um pouco da prioridade em UTI. Desde o ano passado para cá, o setor passa pelo o que os economistas chamam de “uma tempestade perfeita”, uma queda absoluta dos investimentos públicos, uma dificuldade na obtenção no modelo de financiamento. Há um grau de interferência excessivo dos órgãos de fiscalização e controle, o que prejudica o desenvolvimento de obras. Em 2018, a grande prioridade é a gente melhorar o ambiente de negócios para dar uma sustentação de oxigênio, para que as empresas possam atravessar esse período. Pensando a médio prazo, consolidar uma posição de que o setor de construção de obras públicas se firme como um segmento de parceria de investimentos. Porque a recuperação da capacidade de investimentos do governo será muito longa e demorada. As empresas precisam estar muito preparadas para essa modelagem que está na praça, que são as parceiras, concessões e outros tipos de projeto. Estamos em via de firmar um convênio com a Associação Brasileira de Municípios (ABM) no sentido de estimular grupos empresariais, oferecendo propostas de concessões para as prefeituras.
RE – Em quais segmentos há mais deficiência nas obras públicas e onde a participação das empresas associados é essencial?
Carlos Eduardo – Em termos de Brasil, saneamento, sem dúvida. Que ainda prospera em um limite muito pequeno de participação do setor privado ou parceria com o setor público. Mobilidade urbana também. Os problemas se agravaram nas grandes metrópoles. O campo das rodovias também é fértil para melhorias. A manutenção da malha caiu muito nos últimos três anos. Há outras áreas, como iluminação pública e segurança, com a construção de presídios.
* Editor do Relatório Executivo e sócio da Letras & Fatos, parceira estratégica da GO Associados