São Paulo, 26/09/2016 – O investidor que celebra contratos públicos para o desenvolvimento de projetos de infraestrutura encontra-se em situação contraditória. Secaram, por conta da crise fiscal que atravessam governos federal, estaduais e municipais, os outrora abundantes recursos dos bancos públicos de desenvolvimento, grandes responsáveis pelo financiamento de concessões celebradas nos últimos anos. Por outro lado, olhando para além de nossas fronteiras, raramente se viu tanta liquidez e abundância de recursos disponíveis no mundo, conforme artigo publicado hoje no jornal Valor Econômico.
Na visão de Bruno Werneck e Marília Kotait, respectivamente sócio e advogada da prática de infraestrutura do escritório Mattos Filho Advogados, o que impede o encontro entre a demanda doméstica e a oferta externa é o risco cambial, dado que 100% dos recebíveis dos projetos de infraestrutura são corrigidos por índices de inflação e atrelados ao real. Embora haja financiamentos corporativos em moedas estrangeiras, as empresas nacionais não fazem uso do project finance, pois é regra fundamental para este tipo de financiamento que as receitas usadas para amortizar a dívida sejam corrigidas da mesma forma que a dívida.
De acordo com o artigo, não existe hedge de longo prazo no Brasil e só houvesse teria custos impeditivos. Para Werneck e Kotait, há três soluções para o financiamento externo. A primeira seria a indexação de parte da tarifa cobrada dos usuários (ou da contraprestação pública das PPPs) a uma moeda estrangeira, ou uma cesta de moedas estrangeiras. Isso permitiria que parte relevante do financiamento do respectivo projeto poderia ser tomada fora do país. O custo de um financiamento em dólar é menor do que em real, o que reflete em tarifas menores para o consumidor.
A segunda solução seria o estabelecimento de mecanismo por meio do qual o concessionário tenha parte das receitas indexadas a moeda estrangeira, sem repasse ao usuário. O poder concedente assume os riscos (ou benefícios) da variação cambial, por meio de uma conta gráfica com o concessionário.
E por fim, a terceira solução seria o oferecimento pelo governo, diretamente ou via BNDES, de swap de longo prazo aos investidores, sendo para tanto remunerado em um percentual. Mesmo com o real se desvalorizando frente ao dólar em patamares superiores, a existência de reservas cambiais e o aumento de arrecadação na hipótese de desvalorização funcionam como uma proteção natural ao governo. Nestes casos não existiria um impacto tão severo sobre o Tesouro uma vez que as dívidas de project finance são amortizadas ao longo de grandes períodos.
David Abreu – david.abreu@goassociados.com.br